Revista Cult
Foto em Destaque de João Kehl
No dia em que se comemora a luta dos povos indígenas é importante um esforço no sentido de conhecer e entender o pensamento por trás da ação. é sempre um gesto de prudência e bom senso, além de demonstração de inteligência
A Revista publica, como sempre, uma entrevista marcante com Ailton Krenak, um dos maiores pensadores da luta dos povos originários do mundo.
Aos 66 anos, Krenak segue resistindo. Lançou este ano o livro Ideias para adiar o fim do mundo (Companhia das Letras) e vive intensa agenda de palestras, entrevistas e eventos. De sua aldeia Krenak, às margens do rio Doce, em Minas Gerais – ecossistema destruído pela lama da mineração –, o filósofo, escritor, jornalista, ativista e líder de seu povo circula pelo mundo orientado pela intuição e por seus sonhos, com a urgência de traduzir para os brancos fragmentos da cosmovisão dos povos indígenas. “Quando os índios falam que a Terra é nossa mãe, dizem ‘Eles são tão poéticos, que imagem mais bonita’. Isso não é poesia, é a nossa vida. Estamos colados no corpo da Terra. Somos terminal nervoso dela. Quando alguém fura, machuca ou arranha a Terra, desorganiza o nosso mundo”, diz Krenak em entrevista à Cult, realizada em outubro passado, em São Paulo. ( Trecho da matéria de Amanda Massuela e Bruno Weis, ambos da Revista Cult.
Como é ser guiado por um pensamento mágico?
Tem um povo que vive na região do vale do Mucuri, em Minas Gerais, os Maxacali. Eles são vizinhos dos Krenak, que estão na bacia do rio Doce. Nosso território, nossas florestas, foram devastados. O gado entrou lá no começo do século 20. A única coisa que os mineiros sabiam fazer era derrubar mata, botar boi e fazer garimpo. Os nossos parentes Maxacali continuam até hoje cercados por todas aquelas fazendas, sendo moídos por aquela violência colonial em volta deles. Mas 90% deles não falam português e se negam a aprender português – como uma maneira de continuar vivendo neste mundo, que são capazes de recriar todo dia. Eles dão nome a todas as plantas e animais que existiram naquela paisagem antes de ela ser destruída. Cantam para eles, invocam a presença deles e criam um mundo animado para poder habitar. Os Krenak foram várias vezes arrancados da beira do rio e jogados em outros sítios, outros lugares, e tivemos que fazer o mesmo. Tivemos que criar um mundo para poder habitar, paralelo a este que vocês habitam no cotidiano. É uma orientação que pode ser pensada como mágica, mas na verdade é o nosso modo de vida. Enquanto perseverarmos nele, vamos continuar sendo quem somos. Essa experiência de experimentar uma consciência coletiva é o que orienta as minhas escolhas. Se alguém me chama para fazer uma viagem a algum lugar do mundo, eu espero sonhar com aquilo. Se eu não sonhar com a viagem ou com um convite pra sair desse lugar, significa que eu não vou. Nunca sei o que vou fazer. Da mesma maneira que nunca preparo o que vou falar em lugar nenhum.
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